Aquela velha história de que saúde começa pela boca nunca fez tanto sentido. Estudos científicos recentes vêm apontando uma ligação preocupante entre a doença periodontal — aquela inflamação gengival que parece inofensiva no começo — e a progressão do Alzheimer, a forma mais comum de demência entre idosos. Sim, estamos falando de uma conexão direta entre gengiva inflamada e declínio cognitivo acelerado.
“O que acontece na boca não fica só na boca”, alerta o cirurgião-dentista Juliano Borelli, com mais de 20 anos de experiência no Brasil e na Europa. “A inflamação crônica causada por bactérias periodontais pode contribuir para o agravamento do quadro neurológico em pacientes com Alzheimer.”
A doença periodontal se apresenta, inicialmente, como uma simples gengivite — inflamação da gengiva, geralmente acompanhada de sangramentos leves. Se ignorada, evolui para periodontite, uma infecção bacteriana mais severa que ataca os tecidos de sustentação dos dentes. O resultado? Dor, inchaço, dentes frouxos e até perda dentária. Mas o problema vai muito além da estética ou do desconforto.
“Pacientes com Alzheimer têm, naturalmente, mais dificuldade em manter uma higiene bucal eficiente. Isso cria o ambiente perfeito para o avanço da periodontite”, explica Borelli. “E essa infecção libera mediadores inflamatórios que podem afetar outras partes do corpo — inclusive o cérebro.”
Estudos recentes indicam que a inflamação crônica provocada por infecções periodontais pode estar associada ao acúmulo de placas beta-amiloides no cérebro, um dos principais marcadores do Alzheimer. Isso significa que a falta de cuidados com a boca pode acelerar o avanço da doença, comprometendo ainda mais a cognição, a memória e a qualidade de vida do paciente.
“Estamos falando de uma via inflamatória sistêmica. A bactéria não precisa sair da boca e invadir o cérebro diretamente. Basta o corpo estar em constante estado inflamatório para que o Alzheimer ganhe terreno”, reforça Borelli.
Cuidados redobrados com a higiene bucal de idosos
A prevenção, como sempre, é o melhor caminho. E, nesse caso, ela é fundamental para pacientes com Alzheimer, que muitas vezes já enfrentam limitações motoras e cognitivas para realizar tarefas simples do dia a dia — como escovar os dentes.
“É essencial que familiares e cuidadores estejam atentos à saúde bucal desses idosos. Um plano de cuidados odontológicos deve fazer parte da rotina do paciente desde os primeiros sinais da doença”, orienta o dentista.
Entre os cuidados recomendados estão escovações supervisionadas, uso de escovas elétricas (mais práticas e eficazes), visitas regulares ao dentista e acompanhamento especializado para diagnóstico precoce de infecções periodontais.
Manter a boca saudável pode significar não só dentes no lugar, mas também uma mente mais protegida. A conexão entre a periodontite e o Alzheimer é mais um alerta para que a saúde bucal seja levada a sério, principalmente entre a população idosa.
“Cada dente que você salva, cada inflamação que você evita, é uma chance a mais de proteger o cérebro. A odontologia moderna precisa estar integrada ao cuidado integral do paciente, especialmente os mais vulneráveis”, conclui Borelli.