terça-feira, 2 de julho de 2024

Fundaj recebe doação de acervo dos abolicionistas pernambucanos Olegária da Costa Gama e José Mariano Carneiro da Cunha


A Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) recebeu a doação de arquivos fotográficos inéditos relacionados ao casal de abolicionistas pernambucanos Olegária da Costa Gama e José Mariano Carneiro da Cunha, nesta segunda-feira (1º), na Coordenação-Geral de Estudos da História Brasileira (Cehibra), situado no campus Anísio Teixeira, em Apipucos. A contribuição foi ofertada pela Mestra em Educação Gilberta Acselrad, que detinha os registros, e foi representada na ocasião pela jornalista e pesquisadora Adriana Santana. O Cehibra é um centro de pesquisa vinculado à Diretoria de Memória, Educação, Cultura e Arte (Dimeca).

O acervo, composto por duas caixas pequenas com documentos iconográficos, destinados para avaliação e parecer técnico da Comissão Permanente de Acervo Arquivístico, Bibliográfico e Museológico da Fundaj, foi apresentado por Adriana Santana em reunião formada pelo diretor da Dimeca, Túlio Velho Barreto, a coordenadora-geral do Cehibra, Nadja Tenório, e a coordenadora do Centro de Documentação e Pesquisa (Cedoc), Sylvia Costa Couceiro.

Túlio Velho Barreto reforçou a importância dos arquivos em termos institucionais. “A doação de um acervo como este apresenta dois tipos de reconhecimento à Fundaj. O primeiro vem da própria família dos abolicionistas, que confia nesta instituição responsável por fornecer o tratamento dispensado ao acervo previamente doado pelos mesmos na década de 90. É uma aprovação, também, da Fundaj enquanto um lugar de pesquisa, informação, extensão cultural e memória, capaz de receber um acervo desse porte”, comentou.

Para Nadja Tenório, a confiança do conteúdo doado à Fundaj sinaliza a credibilidade da Instituição. “Nosso acervo, de modo geral, é constituído por materiais riquíssimos. Receber esse material só comprova mais uma vez a relevância da instituição, que busca preservar e disponibilizar a digitalização ao público, por meio de acesso on-line e democrático”, disse, destacando a importância de levar este acervo para o público, por meio de publicações e difusão nas plataformas disponíveis  

A coordenadora do Centro de Documentação e Pesquisa (Cedoc) da Fundaj, Sylvia Costa Couceiro, explicou a relevância desse tipo de material para a memória pernambucana e à Fundaj. “Os personagens retratados nessas imagens foram atuantes na luta abolicionista do Estado, em especial, e acho que a mais importante, a presença feminina de Dona Olegarinha, que reforçou o papel das mulheres da família na preservação desse acervo, caso contrário não teríamos acesso ao mesmo nos dias atuais”, comenta a coordenadora. 

Nesta nova doação, são apresentadas imagens que não estão à disposição do público, pertencentes ao núcleo familiar e cotidiano destas pessoas públicas. “Essas imagens se confundem com a própria história do Brasil. São registros que abarcam desde o fim da Monarquia até o início da República, comportando registros de meados do século XIX à década de 1930. Podemos destacar imagens de um idoso José Mariano, após se retirar da política, assim como imagens da família no Rio de Janeiro, quando logo após a morte de Olegarinha, não retornam a Pernambuco”, comenta a representante da família, Adriana Santana

Em sua linha de pesquisa do pós-doutorado, Adriana Santana investiga qual a participação de Olegária da Costa Gama no movimento abolicionista. “É na Fundaj que encontramos a maior parte das informações sobre ela, uma dessas é sobre a sua participação na campanha de Joaquim Nabuco para deputado constituinte. Ela vendo que havia uma possibilidade do abolicionista perder para um candidato conservador acaba empenhando suas joias para ajudar na corrida eleitoral do abolicionista. Embora tenha tido uma vida curta, Olegária, dona do acervo doado, também fez parte de uma sociedade abolicionista feminina chamada Aves Libertas, além de ajudar com fugas e acoitamento de pessoas escravizadas em sua casa no Poço da Panela, em Recife”, concluiu a jornalista e pesquisadora. 


Casal abolicionista

O casal de abolicionistas José Mariano Carneiro da Cunha (1850-1912) e Olegária da Costa Gama (1859 - 1898) eram atuantes na causa. José Mariano, da mesma forma que Joaquim Nabuco, Barros Sobrinho, João Ramos, Alfredo Pinto, Phaelante da Câmara, Vicente do Café, Leonor Porto, e tantos outros mais, foi membro da Associação Emancipatória Clube do Cupim, fundado em 1884, no Poço da Panela, que alforriava, defendia e protegia os escravos. 

Olegária foi uma figura de grande relevância para a comunidade negra do século XIX. Ela residia no Poço da Panela, onde, na época, existia um dos grandes redutos abolicionistas pernambucanos. Apoiava os escravos fugidos, roubados das senzalas, ou alforriados, e os ajudava a fugir em barcaças, que, do Poço da Panela, desciam o rio Capibaribe, camuflados com capim e ramagens, para passar defronte da Chefatura de Polícia na Rua da Aurora (atual prédio da sede da Polícia Civil de Pernambuco), a caminho da Província do Ceará, onde a escravidão havia sido abolida em 25 de março de 1884. 

Apesar de José Mariano ter sido preso, sofrido inúmeras humilhações por defender a causa abolicionista, sua esposa prosseguiu lutando em prol da abolição da escravatura. Mesmo não sendo filiada ao Clube do Cupim, Dona Olegarinha teve um papel marcante na história do abolicionismo. Trabalhou no Clube e compareceu a vários atos e protestos, sobretudo quando seu marido foi preso. Esteve presente, em 25 de setembro de 1880, ao primeiro aniversário da Sociedade Emancipadora, ocasião em que foram distribuídas 35 cartas de alforria. E, em 1884, congregou seus esforços em um evento de maior relevância, realizado pelo Clube do Cupim, quando, clandestinamente, foram libertados 70 escravos do Engenho São João, pertencente ao Barão de Muribeca. 

Devido às complicações de uma gripe, Olegária da Gama Carneiro da Cunha Mariano faleceu em 24 de abril de 1898. Foi enterrada no Cemitério de Santo Amaro, no dia seguinte à morte, acompanhada por uma multidão de pessoas, que fizeram vários discursos emocionados com a sua partida. No dia de sua morte, José Mariano estava no Rio de Janeiro e, sequer, pôde comparecer ao enterro de sua mulher. Com a morte de sua esposa, José Mariano se afastou da vida pública, vindo a falecer de um derrame cerebral, em sua residência, no Rio de Janeiro, em 8 de junho de 1912. Seu corpo foi embalsamado e levado para o Recife, a bordo do navio Ceará. 

(*) Com informações da Pesquisa Escolar da Fundaj.