“Eu sou um homem de ação. Posso não saber, mas faço. Ignoro, mas faço. Se as pessoas parassem de pensar tanto e trabalhassem, a economia cresceria. Para que pensar?”. Essa é a pergunta lançada pelo político ao chegar ao consultório de uma psicanalista. Em cena, ela propõe um diálogo que exige autorreflexão e subjetividade; mas isso se mostra impossível, pois rapidamente entendemos a personalidade autoritária do paciente, com posicionamento de extrema direita.
A peça Um fascista no divã se dá nesse cenário hostil. Foi escrita por Marcia Tiburi e Rubens Casara entre 2016 e 2017, antevendo os desafios que o Brasil enfrentaria nos anos seguintes, e lançada em 2021. A escritora e também filósofa foi alvo de ataques e ameaças de morte diversas vezes, e após ser perseguida politicamente, deixou o Brasil depois das eleições de 2018.
A atriz Giovana Echeverria, que interpreta a psicanalista, idealizou trazer para a cena o texto que coloca lado a lado o duelo dessas linhas de pensamento e se uniu a André Capuano, que criou o jogo cênico e dirige o espetáculo. A estreia acontece dia 2 de março de 2023 e segue em cartaz até dia 25, de quinta a sábado, na SP Escola de Teatro, na Praça Roosevelt, com ingressos gratuitos.
O texto reflete e questiona a ascensão do fascismo no Brasil e o público exerce um papel fundamental, já que o personagem do fascista será representado por um coro de não atores, formado por diferentes pessoas a cada sessão do espetáculo.
“Nós buscamos uma forma de mostrar a complexidade que nos atravessou quando passamos a imaginar a relação entre uma psicanalista, que não é fascista, e um paciente fascista. Tentamos lidar cenicamente com as questões suscitadas em nós pelo texto da Márcia Tiburi. Um fascista só não faz terror e sempre haverá uma máquina fascista operando, enquanto o capitalismo correr solto. Por isso criamos na peça um coro guiado remotamente para assumir o personagem do fascista. A Giovana, que faz a psicanalista, vai precisar lidar com o modo de esse coro agir, com a circunstância de cada dia”, revela o diretor.
O cenário da peça inicialmente é um consultório, mas ele vai se modificando ao longo das cenas: se transforma em uma sala de jantar, em um programa de televisão ou em um acampamento. Quem faz essa mudança de cenário também é o coro do dia. “Por causa do modo como será guiado, haverá um desajuste teatral na movimentação do coro, uma falta de acabamento do gesto. Essa falta de acabamento também é proposital, porque não entendemos de fato o corpo fascista contemporâneo. Ao mesmo tempo que seus movimentos são extremamente eficazes, apoiados por uma máquina, a aparência é de falta de habilidade, como as marchas que vimos na frente dos quartéis e as inúmeras cenas bizarras que eles despejaram na nossa cara nos últimos anos”, diz Capuano.
Para Giovana, essa forma de encenação reforça a proporção que o delírio em massa tomou, facilita a experiência que o jogo de linguagem propõe de desnaturalizar os clichês absurdos ditos pelo fascista com frases misóginas, racistas, homofóbicas, sem qualquer constrangimento. “É muito importante entender e visualizar que por mais inacabado e ridículo que possa parecer, o comportamento autoritário jamais pode ser descredibilizado e a indiferença nutre o crescente do absurdo", diz a atriz.
A ação se passa durante algumas sessões entre a psicanalista e o fascista e os diálogos levantam questões sobre autoritarismo, direitos humanos, religião, entre outras. A analista procura entender o mecanismo desse pensamento, sem conseguir criar um laço possível.
Durante a peça existe uma contextualização histórica apresentada em vídeo, com imagens documentais e estudos sobre fascismo e antifascismo. A linguagem audiovisual vira uma ferramenta aliada e mostra o fascismo como um movimento antigo, estrategicamente elaborado a serviço de outros setores. Uma das frases da peça é do filósofo Max Horkheimer que diz: “Quem não quer falar de capitalismo deveria também se calar sobre o fascismo”.
André Capuano é diretor, ator e filósofo. Mestrando em Artes Cênicas no Instituto de Artes da UNESP. Desde 2002 pesquisa a relação entre o teatro e o cotidiano urbano, coordenando a pesquisa USO – Teatro Urbano. Nessa pesquisa criou por exemplo o espetáculo Corpo-Cidade Rotinas (Ficção), concebido e atuado por atores, atrizes e dezenas de trabalhadores e trabalhadoras da República, no centro da cidade de São Paulo. Além dessa pesquisa cênica, criou e atuou em diversos espetáculos teatrais, com vários coletivos e artistas da cidade, dentre os quais: As Mamas de Tirésias, de Guillaume Apollinaire; Verdade, Pornoteobrasil e Trilogia Abnegação, com o grupo Tablado de Arruar; Barafonda e o Santo Guerreiro e O Herói Desajustado, com a Cia São Jorge de Variedades; Branco – o Cheiro do Lírio e do Formol, Refúgio e Floresta, com Alexandre Dal Farra; entre outros.
Giovana Echeverria é atriz, analista de roteiro e comunicadora. Recentemente esteve em cartaz no Theatro Municipal de São Paulo com a Ópera das Três Laranjas, texto de Prokofiev, com direção de Luiz Carlos Vasconcellos; e no Sesc Paulista na performance Cartas ao Mundo, concebido e dirigido por Bia Lessa. Estudou artes dramáticas na UFRGS, no Teatro Nilton Filho, em Porto Alegre, e Screen Acting na Academy of Art School of Acting, em São Francisco, também teve passagens nos grupos Tá na Rua e Teatro Oficina. Em 2009, começou sua carreira no audiovisual na Rede Globo, participou das séries Verdades Secretas 2, Justiça (indicada ao Emmy) e Lei de Murphy, e das novelas Orgulho e Paixão, Sete Vidas e Malhação Id. Atuou também na Rede Record em duas grandes produções de novelas, Gênesis e Vidas em Jogo. No Canal Brasi, participou da série Meus dias de Rock; e foi antagonista da série Perrengue para MTV/MIAMI. No cinema protagonizou dois longas #GAROTAS, distribuído pela Paris Filmes, e Superfície da Sombra, exibido pela Paramount e Amazon Prime, também atuou no filme Meu Mundo Não Cabe nos Teus Olhos, produção Globo Filmes, indicado a prêmio no Los Angeles Brazil Film Festival.
Ficha Técnica
Texto: Marcia Tiburi e Rubens Casara
Idealizaão: Giovana Echeverria
Direção: André Capuano
Elenco: Giovana Echeverria
Direção de arte: Renato Bolelli
Iluminação & vídeo: Daniel Gonzales
Sonoplastia: Miguel Caldas
Operador de luz: Daniel Gonzales
Corifeu: Benedito Canafístula
Cenotécnico: Bibi de Bibi
Assistente de iluminação: Felipe Mendes
Assistente de direção de arte: Wesley Souza da Silva
Design: Veni Barbosa
Foto divulgação: Flora Negri
Foto/filmagem: Cabaça Produções
Assessoria de imprensa: Canal Aberto
Produção: Corpo Rastreado | Gabs Ambròzia
Serviço
Temporada de 02 a 25 de março de 2023
Quinta, Sexta e Sábado às 20h30
SP Escola de Teatro – Sede Praça Roosevelt
Praça Roosevelt, 210
Ingressos gratuitos – via Sympla
Lotação - 60 lugares
Classificação indicativa – 16 anos