quinta-feira, 31 de março de 2022

#VcNoBlog Thyana Galvão

 

A professora da UFPE e arquiteta Thyana Galvão novamente abrilhanta nosso blog com seus textos sempre carregados de sensibilidade. Aqui ela escreve para suas filhas e nós teremos o privilégio de ler agora: 

JORNADA DE CURA E LIBERTAÇÃO: A MAIOR HERANÇA PARA MINHAS FILHAS


Uma frase de Christiane Northrup lida por mim, recentemente, me trouxe muita reflexão:

“A maior herança de uma mãe para uma filha é ter se curado como mulher”. Tratei de buscar informações sobre a tal Christiane: apesar da postura antivacina (da qual sou contra, mas respeito), trata-se de uma médica ginecologista-obstetra e "visionária na saúde da mulher", certificada com mais de trinta anos de experiência clínica, ex-professora assistente na University of Vermont College of Medicine e autora dos best sellers Corpos Femininos, Sabedoria Feminina, A Sabedoria da Menopausa e Deusas Nunca Envelhecem. Gostei das informações que li e cheguei a adquirir um de seus livros... A frase não me saía da cabeça.

Depois do câncer de mama, a palavra "cura" foi ressignificada na minha vida. A doença me levou as duas mamas, mexeu com minha feminilidade e com minha maternidade também... Fui uma mãe que amamentou as filhas por muitos anos e não ter mais os seios alterou meu referencial de mãe doação. Enfim, são muitas as ressignificações que tenho feito no curso desses um ano e meio pós diagnóstico. Hoje a cura que trago aqui para vocês e que vem sendo trabalhada por mim é a cura da alma. A cura de tudo que já fui, sem querer ter sido. Essa cura está ligada ao câncer também. Aliás, é o olhar da doença sob a ótica que esse adoecimento do corpo é consequência e não causa. Consequência de muitas escolhas. Sei que não posso mudar o curso do que passou, mas posso trabalhar essa cura maior... para mim e para as gerações futuras (minhas filhas, netas, etc.).

Sobre a afirmação trazida por Chris, penso que cada filha leva consigo a sua mãe. É um vínculo eterno do qual nunca poderemos nos desligar.

Porque, se algo deve ficar claro, é que sempre teremos algo de nossa mãe. Contudo, para termos saúde e sermos felizes, cada uma de nós deve conhecer de que maneira nossa mãe , seja a mãe biológica, de criação, uma tia, uma avó ou mesmo outra pessoa que a tenha representado em sua vida influenciou nossa história e como continua influenciando.

Porque a mãe está lá sempre... durante essa reflexão, vários questionamentos foram feitos (de mim para mim mesma): que tipo de mãe venho sendo? Quero continuar como sou? O que me desagrada em mim (como mãe)? O que me agrada na Thyana mãe?

Pensei como somos, enquanto mulheres, cobradas diariamente.
Daí resolvi escrever uma carta às minhas filhas:

"Carta de uma mãe às suas meninas (baseada no texto original espanhol Evolución Consciente, no app Criar en positivo)
Filhas, eu liberto vocês de serem quem eu fui/sou. Eu fui uma "menina boa" e como mãe as liberto de "terem que ser" porque não é saudável.
Ser uma "menina boa" significa ceder parte do controle da sua vida aos outros; tentar agradar as pessoas (que você mais quer bem ou não), de forma inconsciente, as custas da própria dor ou da injustiça. Obedecer "aos mais velhos" (pais, professores, etc) deixando de lado sua essência; não te permitir a raiva. Não falo em ser mal educada ou agressiva... falo, filhas, que vocês, em respeito às suas individualidades, "não deixem de ser quem vocês verdadeiramente são".
Minhas filhas, ser uma menina boa significa, infelizmente, (e muitas vezes) adoecer. Adoecer para fugir da pressão de um mundo cruel, cheio de julgos e punições que limita a própria criatividade, a liberdade e o jogo de experimentação da vida, que coloca em uma gaiola nossos próprios desejos e algumas emoções, sob o disfarce de que é por causa do seu próprio bem.
Como mãe, eu liberto vocês de tudo isso... eu as liberto da chantagem emocional. Liberto vocês de ouvir: "se você não fizer isso ficarei chateada, vou embora ou não te amo mais". Eu liberto vocês, minhas filhas, do "porque eu mando" ou do "porque sou seu pai/sua mãe". Eu liberto vocês da necessidade de agir para agradar os outros, incluindo eu mesma. Eu as liberto, filhas, para viverem (n)a verdade.
Amem e se deixem amar. Mostrem ao mundo, com muita amorosidade, que o valor de vocês está exatamente em serem do jeito que são. Únicas. Cada uma a sua maneira.
Eu fui uma menina boa que sobreviveu. Hoje posso dizer que sou uma adulta bem desobediente e, muitas vezes, subversiva.
Mas sofri bastante no caminho: aceitei parceiros que não me mereciam, passei por danos psicológicos e até adoeci.
Eu fui uma menina boa, hoje eu cresci, mudei e me libertei.
Como mãe, eu liberto vocês de tudo isso.
Com amor,
Mamãe Thyana"
E assim, curada, quero caminhar ao lado de minhas filhas. Vendo o mundo da forma mais leve: não desejo ser a melhor amiga delas, apenas quero ser a MELHOR MÃE que elas possam ter.
P.s.: Gratidão a minha mãe e a todas que vieram antes de mim. Eu respeito minha ancestralidade.