Como transformar as potencialidades naturais em desenvolvimento do bioma e seus moradores? indagou Salomão Medeiros, diretor do Instituto Nacional do Semiárido (Insa), durante a audiência pública conjunta ontem em comissões da Câmara Federal onde abordou as riquezas da Caatinga. A produção familiar de energia fotovoltaica consorciada com alimento (sistema agrovoltaíco) foi um meio eficiente e de baixo custo demonstrado no local por pesquisadores do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA), Universidade Federal de PE (UFPE), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
Além da produção de energia e de alimentos em pequenas propriedades, o sistema agrovoltaico, tecnologia pioneira no País e em desenvolvimento no Sertão de Pernambuco pela rede nacional de pesquisadores Ecolume, financiada pelo CNPq, capta água de chuva e está integrado por sistemas de reuso e tratamento de água servida para a produção de vegetais, aves e peixes, mas também mudas de plantas nativas para o reflorestamento (recaatingamento) do bioma, de modo a contribuir para a umidade do solo e para a regulação do microclima local, que enfrentam processo de aridez.
Paulo Nobre, pesquisador do Insa, ilustrou as vantagens da abundância da incidência solar no semiárido brasileiro. Mostrou dados inclusive sobre as evidências já reais do aumento da temperatura e redução pluviométrica no Sertão e dos cenários de intensificação com o avanço das mudanças do clima. Desse modo, defendeu a produção de energia consociada com alimento e uso racional da água e preservação do bioma, ora exposto pelo sistema agrovoltaico do Ecolume. O pesquisador da Embrapa, Eduardo Assad, endossou a tecnologia e concluiu que a experiencia da Ecolume é indispensável como uma solução eficaz e de baixo custo para tal cenário.
Numa área de apenas um hectare, diante desse cenário de menos chuva e mais calor, Paulo garantiu que se produzir milho de forma convencional, a remuneração do agricultor é só de cerca de R$ 3 mil por ano, enquanto se optasse pela produção de energia consociada com outros alimentos, renderia 1,5 milhão anual só com energia.
“2/3 das áreas degradadas no Sertão brasileiro estão localizadas em 98% das propriedades rurais. Portanto, abrange majoritariamente as pequenas propriedades rurais. E o potencial de geração de energia nestas áreas é ampla. Bastaria 10% dessas áreas degradadas cobertas por painéis fotovoltaicos para dobrar a produção de energia solar no País, distribuindo riqueza aos agricultores familiares e, consequentemente, para as cidades e os estados com os impostos inerentes.
O protótipo pioneiro do sistema agrovoltaico da rede Ecolume no Sertão pernambucano de Ibimirim-PE usa só uma área de 24 metros quadrados. Além de placas fotovoltaicas para produção de energia, o sistema integra outros subsistemas. Produz alimentos por tubos (aquaponia) na sobra das placas e com irrigação circular. Produz água via uma tecnologia do Insa de tratamento e reuso de águas servidas, usadas para irrigação de mudas nativas por gotejamento.
“Apesar de uma área só de 24 m², estima-se que o faturamento de cada umidade agrovoltaica chegará a R$ 10.362 anual com a produção de energia, alimento e de mudas”, destacou na audiência Francis Lacerda, coordenadora do Ecolume e do Laboratório de Mudança do Clima do IPA. A pesquisadora conta que em menos de dois anos, o sistema já se paga.
Os benefícios bioeconômicos com a preservação da Caatinga são outros meios de transformar as riquezas naturais do bioma em desenvolvimento. Já existem inclusive cooperativas de agricultores familiares no sertão da Bahia onde produzem até cerveja com umbu, planta nativa do semiárido. A diversidade de usos e finalidades de plantas nativas não somente para a indústria alimentar, mas também com potenciais farmacológicos, para os defensivos agrícolas e cosméticos também foram colocados no evento pela professora Márcia Vanusa, da UFPE, por Salomão e Eduardo Assad. Portanto, a produção de mudas caatingueiras para o seu reflorestamento ultrapassa os benefícios ambientais (solo, água, clima) para o semiárido.