A jornalista e radialista Adriana Amâncio está novamente participando do blog é você também pode participar com artigos, matérias, contos, crônicas e poesias. Mande um e-mail para tparanhos@hotmail.com.
Escolha
Pela centésima vez, ela pensava na decisão, que adiava, há meses, desde a última tapa, desde a última humilhação; desde a última ameaça; desde a última traição, mas também, desde a última noite acordada, sozinha, cuidando dos bebês e do último dia, em casa, lavando passando e cozinhando. Quase sempre, a disputa entre essas ideias, que gerava uma dúvida e angústia infinitas, acontecia na sala da pequena casa, de quatro cômodos – mas que por ser própria, colocava qualquerfamília em uma condição confortável, para a vida bucólica que se leva -, no interior de Pernambuco, município de Barreiros, um local onde o tempo passa em um ritmo no qual as pessoas conseguem se preocupar e acompanhar as vidas uma das outras.
O fim do conto, que era para ser de fadas, recriava um verdadeiro tribunal na imensidão de seus pensamentos. De um lado, os ensinamentos da mãe, os valores da sociedade, a necessidade de criar os filhos ao lado do pai, a identidade que se afirma na zona de conforto, do senso comum. Do outro, a inquietação, o sofrimento físico e moral, os sonhos, as expectativas, a necessidade de ser livre.
Em uma manhã de domingo, ela banha as crianças e veste a melhor roupa que eles tinham. Olha para o filho mais velho, e como que buscando forças para optar por um dos lados, lhe faz um carinho no rosto. Ele, até então com apenas dois anos, sorri e fita os seus olhos profundamente. Essa reação parecia dizer: “mãe, vai! E se der medo, vai assim mesmo!”. O filho mais novo, com apenas seis meses, dormia profundamente. E dessa forma, ele também a encorajou. Seu sono profundo, dizia exatamente qual a proteção e o carinho que ele necessitava e dizia ainda, quem poderia oferecê-lo. Ela, apenas ela.
Assim, a princesa que nunca conheceu o seu príncipe, retirou a aliança e colocou-a sobre a mesa de jantar, junto com uma foto do companheiro, que carregava desde o início do namoro, há oito anos. Tomou o filho mais novo nos braços e, ao mesmo tempo, equilibrou a bolsa com todos os pertences. Segurou o filho mais velho pela mão e saiu, sem ao menos olhar para trás. Era assim que ela queria escrever a sua nova história, sem relembrar o passado que tentou impedi-la. Era assim que a dormostrava o seu lado pedagógico e mais especial para ela. Era assim que ela sentia na pele, uma frase, que de maneira fortuita, havia lido em uma obra de Simone de Beauvoir. “As mulheres não nascem mulheres, tornam-se mulheres”. Assim então, ela mudava o curso do destino e tornava-se mulher!
Adriana Amâncio