Em meio a pautas como o direito à moradia, a pré-candidatura nacional de seu líder Guilherme Boulos, o desabamento de um prédio em São Paulo (ocupado por outras entidades que não o MTST), as polêmicas sobre o pagamento de "aluguéis", a violenta repressão do Estado e ocupações recentes, como a Carolina de Jesus e a Marielle Vive, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) se engaja em uma série de lutas, que incluem ocupações, desmentidos de fake news e a luta constante contra a criminalização dos movimentos sociais. E para mostrar aos nossos leitores, o blog conversou com militantes do MTST Pernambuco, que nos contou a história do grupo, algumas vitórias e o cotidiano de ocupações como a Marielle Vive, na Praça da Independência, no centro do Recife. Os links que você vê aqui na matéria são de matérias do Blog sobre o MTST.
1) Em relação às fake news que relacionaram o MTST ao aluguel de ocupações, que providências o movimento tomou?
O MTST está encaminhando denúncias judiciais referentes às calúnias publicadas e tem se colocado no sentido de expor a verdade. Temos muita tranqüilidade a este ponto, a partir do qual construímos nossa ação, que se dá na base da confiança política e da organização popular, sem cobrança financeira.
2) Sobre a ocupação Marielle Vive: quantas famílias vivem no local? Alguma vistoria chegou a ser feita em relação à segurança das famílias?
Hoje a ocupação conta com 80 famílias cadastradas. Desde o início, a segurança tem sido uma preocupação nossa. Estamos em fase de elaboração de projeto arquitetônico para adequação do imóvel e também tivemos uma visita de equipe de engenharia que avaliou o imóvel. Estamos tomando as medidas necessárias que foram orientadas pela equipe técnica.
3) Quem quiser apoiar vocês de alguma forma, a exemplo de doações, como proceder?
A ocupação vive da solidariedade das pessoas e organizações. Mantemos uma cozinha coletiva para alimentar as mais de 200 pessoas nas 3 refeições, garantir limpeza permanente e coletiva do imóvel e também outras necessidades como medicações e produtos para crianças(fraldas, leite, etc.). Outras demandas aparecem no cotidiano, As pessoas interessadas em doar financeiramente, contactam o movimento. As que querem levar pessoalmente na ocupação, também podem fazê-lo.
4) Sobre outras ocupações do MTST em Pernambuco, quantas são?
Hoje, temos a ocupação Marielle Franco (na Praça do Diário), a Carolina de Jesus (no Barro) e acompanhamos a ocupação Sítio dos Pescadores (no Bode) e o Pocotó (em Boa Viagem).
5) Conte-nos um pouco da história do MTST no estado
O MTST Brasil é um dos principais instrumentos do país no combate as desigualdades que essa forma de urbanização vem trazendo para a nossa sociedade. A luta dos trabalhadores e das trabalhadoras sem-teto cresce ao passo que as contradições da nossa sociedade se tornam mais nítidas.
E o surgimento do movimento no estado de Pernambuco, no final de 2015, veio somar na luta por uma cidade mais justa, democrática e com moradia digna para o seu povo. A união de lutadoras e lutadores sociais que disputavam, em sua maioria, a cidade do Recife, trouxe um movimento bastante diverso, visto que seus componentes são oriundos de arenas de lutas de diversas: comerciantes informais, estudantes, militantes partidários ou sem vinculação nenhuma, professores etc.
Em abril de 2016, o MTST Brasil fez sua primeira ocupação na cidade do Recife, chamada de “Nova Canudos”. Tal ocupação resistiu por 24 horas intensas de repressão policial, a mando do Governo do Estado de Pernambuco e de “importantes” figuras do cenário local. Entretanto, o movimento conseguiu a garantia de 500 casas pelo Governo Federal, promessa não cumprida. Afinal, houve o golpe que assolou o país não foi só na casta política: o povo saiu prejudicado.
Apesar de a primeira ocupação ter durado pouco tempo, o movimento teve a capacidade de se reorganizar e preparar sua segunda ocupação, realizada no dia 17 de fevereiro de 2017. A ocupação “Carolina de Jesus” resistiu e resiste bravamente, mesmo como todas as adversidades possíveis que uma ocupação possa ter. Os seus ocupantes tem enfrentado os problemas cotidianos de frente, entendendo o significado da luta de forma ampla, participando de diversos atos que não se restringem aos da pauta de moradia; para além das investidas da polícia pernambucana contra o local. A chuva, a escassez de recursos e a precariedade das instalações se refletem na maior vontade de lutar e de entender que só lutando é que se muda a vida.
O maior exemplo de luta que tais lutadores e lutadoras demonstraram ocorreu no dia 21 de fevereiro de 2017, apenas 4 dias após o processo de ocupação. Centenas de sem-teto se deslocaram para a Companhia Estadual de Habitação e Obras (CEHAB) com o fim de protestar por algo que é garantido pela constituição: a moradia. Tal episódio ficou conhecido como o “Massacre da CEHAB”, pois a repressão policial foi violentíssima, sendo que pessoas foram atingidas por armas letais, além de dezenas de feridos por bala de borracha e estilhaços.
Na ocasião, 10 militantes foram presos em flagrante, sendo acusados de vários crimes, dentre eles o de associação criminosa, conhecida popularmente como formação de quadrilha. Após um dia presos, houve uma onda de solidariedade de âmbito nacional, ocorrendo com a ilegalidade do flagrante conforme decisão judicial decorrente da audiência de custódia. Tal fato só fez aumentar a união dos militantes do movimento, além de reforçar os laços de confiança entre os ocupantes e o MTST Brasil. A luta ilustrada no “Massacre da CEHAB” trouxe também vitórias importantes para todas e todos que batalham na Carolina de Jesus.
O Governo pernambucano cedeu o terreno para que seja construído um habitacional. Ao mesmo tempo, foi enviado um projeto para construção desse habitacional, estando faltando apenas a aprovação do mesmo. A fé na luta das famílias e sua disposição para mudar os rumos de suas histórias foram determinantes para que tal vitória venha a ser confirmada. A trajetória que a ocupação Carolina de Jesus é marcada pela resistência e com forte dinâmica de protagonismo das mulheres.
O trabalho coletivo, o entendimento que ninguém ganhará nada sozinho, a consciência de classe (e observar que na luta de classes não há empate), a alegria de cada mutirão e a descoberta de novas lideranças oriundas do seio popular são alguns dos exemplos da experiência que o MTST Brasil vem experimentando em Pernambuco.
Dessa experiência, surgiu tanto a proposta de formação do setorial nacional de mulheres, como uma ocupação protagonizada pelas mulheres: a Marielle Franco. Ocupação que surge no bojo de discussão da área central do Recife, dos potenciais existentes para revitalização desse território da cidade com habitação popular.
Nesse sentido, ocupamos no dia 19 de março o antigo Edifício Sulamérica, patrimônio histórico da cidade, abandonado há 21 anos e com uma dívida de IPTU que supera R$ 1,5 milhão. Lá, além da garantia do direito à moradia, estamos mantendo funcionando uma creche, uma horta comunitária e mantendo uma agenda de atividades de formação e cuidado coletivo das famílias.