Depois de um congresso na capital pernambucana, alguns dos principais nomes da advocacia brasileira lançaram a Carta do Recife, sobre abusos da Lava Jato e dos meios de comunicação, na sua cobertura.
CARTA DO RECIFE
Os advogados criminalistas reunidos no "2º Seminário Direito Penal e Processo Penal em tempos de Lava Jato", realizado pela União dos Advogados Criminalistas - UNACRIM nos dias 2, 3 e 4 de maio de 2017 na cidade do Recife, capital do Estado de Pernambuco, Brasil, após três dias de debates acerca da atual conjuntura de aplicação do direito penal e processual penal no Brasil, contando com depoimentos e discussões aprofundadas sobre o referido tema, vêm a público externar, através dos signatários desta carta, o seguinte:
• São preocupantes: (I) a forma como vem sendo conduzida a Operação Lava Jato, considerando sistemáticas ofensas a garantias constitucionais dos acusados que atingem o direito de defesa; e (II) a reverberação dessas práticas ilegais em toda a justiça criminal brasileira;
• A publicidade opressiva veiculada pela mídia brasileira tem inegável capacidade de interferir nos julgamentos da Operação Lava Jato e de outros casos de repercussão, maculando a imparcialidade do julgador através de pressões indevidas e manipulação da opinião pública;
• Também merece atenção o fenômeno da criminalização do exercício da advocacia por parcela da magistratura, dos órgãos responsáveis pela persecução criminal e dos meios de imprensa, que deve ser visto como um sinal de enfraquecimento de garantias do cidadão e menosprezo ao múnus público das funções do advogado no processo penal;
• A condução da delação premiada no país deve ser melhor regulamentada para que não se ofenda o direito de defesa, não se sujeite o delator a abrir mão de suas garantias constitucionais e para que não se criem desequilíbrios entre as partes acordantes. A lei deve prever meios de garantir a preservação da espontaneidade e voluntariedade da parte delatora, através da definição dos procedimentos a serem obedecidos ao longo das negociações do acordo e de sua execução;
• Devem ser rechaçados a banalização da prisão preventiva e o seu uso no intuito de obter delações premiadas ou confissões;
• Deve ser rechaçado o uso da condução coercitiva contra investigados e réus, seja porque não há previsão legal, seja porque ela não se coaduna com os princípios da ampla defesa e dignidade da pessoa humana;
• Deve o juiz presidente do feito controlar o sigilo de todas as informações do processo que importem em quebras constitucionais, zelando para que não sejam divulgadas ou vazadas para a imprensa antes da prolatação de sentença;
• As partes que celebram o acordo de delação premiada e o juiz que o homologa devem zelar pelo sigilo de todas as informações ali colhidas, não permitindo vazamento de informações para pessoas estranhas ao processo, até que esses elementos sejam corroborados na instrução penal e seja reconhecida, na sentença, a efetividade da delação;
• Deve ser rechaçado o cumprimento de pena antes do seu transito em julgado, a teor do que define a Constituição Federal e o Código de Processo Penal;
• Espera-se que os Tribunais brasileiros retomem as rédeas da aplicação dos direitos do cidadão elencados na Carta Constitucional de 1988 e coíbam os abusos de poder praticados, para que a Operação Lava Jato cumpra seu importante mister, mas não deixe aos aplicadores da lei um legado de sistemáticas violações ao processo penal brasileiro e ofensas ao direito de defesa incompatíveis com o Estado Democrático de Direito.
Recife, 04 de maio de 2017.
Diretoria da UNACRIM
Carlos Barros
Gustavo Rocha
Yuri Herculano
João Vieira Neto
Maria Carolina Amorim
André Gouveia
Carlos Sá
Conferencistas
Antônio Nabor Areias Bulhões (DF)
Alberto Zacharias Toron (SP)
Antônio Carlos de Almeida Castro (DF)
Geraldo Prado (RJ)
Ademar Rigueira Neto (PE)
Fábio Tofic Simantob (SP)
Talita Caribé (PE)
Yuri Félix (SP)