Depois da extinção do programa de intercâmbio Ciência sem Fronteiras (CsF) para alunos da graduação, as notícias são desanimadoras também para quem batalha uma bolsa de pós-graduação no Brasil. Dos 7.408 incentivos que a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) congelou em abril, conforme mostrou o GLOBO à época, 43% permanecem suspensos, sem previsão de serem reativados. O governo defende que os 3.221 auxílios foram bloqueados porque estavam ociosos. A justificativa, porém, é rebatida por estudantes de programas de mestrado e doutorado pelo país. Há quem já cogite desistir dos cursos.
Terminado o prazo de dois meses, de abril a maio, que o governo, ainda na gestão petista, abriu para analisar a eventual ociosidade dos programas, negando que se tratava de cortes, a esperança dos alunos era por uma normalização. Mas, das 7.408 bolsas suspensas, 4.187 foram reativadas. O número de benefícios congelados (3.221) representa 3,6% do total de 88.314 bolsas na Capes.
A tesourada em mais de três mil incentivos atrapalhou os planos de Patrícia Marques. Cearense de Tianguá, a jovem de 27 anos, recém-saída do mestrado, ingressou no doutorado em Ciência e Tecnologia de Alimentos na expectativa de obter a bolsa para custear os estudos. Ela conta que o programa de pós-graduação que cursa, na Universidade Federal do Ceará, perdeu duas das três bolsas Capes que tinha.
— Disseram que iam liberar as bolsas em junho. Cadê? Já mandei e-mail e carta para a Capes, tentando saber o que está acontecendo. Pior que as cotas da agência estadual de fomento também foram reduzidas. Não sei onde há bolsas sobrando — questiona Patrícia.
A doutoranda vive em Fortaleza sozinha. A família permanece no interior do estado e, segundo Patrícia, não tem condições financeiras de custear suas despesas. Ela conta que a conclusão do mestrado, ano passado, só foi possível devido à bolsa que recebia, usada para pagar os gastos básicos, como moradia, alimentação e transporte. Com tempo para se dedicar aos estudos, Patrícia conseguiu parcerias para desenvolver o projeto de beneficiamento da palma-forrageira, uma espécie de cacto, para alimentação humana.
— Não sei o que vai ser de mim. Se eu sair para trabalhar num emprego que exija 40 horas semanais, terei que desistir do doutorado, para o qual passei a vida inteira me preparando. Estou raspando minhas economias e contando com ajuda da minha avó e de algumas tias, mas uma hora elas não poderão mais ajudar — conta.
Jornal O Globo