Trânsito caótico, deslizamentos de barreiras e alagamentos são problemas recorrentes no dia a dia do Recife. Mas não são recentes. São discutidos há pelo menos cinquenta anos, quando o sociólogo Josué de Castro escreveu o livro ‘A Cidade do Recife - Ensaio de Geografia Humana’. A obra, que retoma a urbanização da capital de Pernambuco e indica possíveis soluções para alguns de seus desafios, foi relançada na quinta-feira (14) no centro Josué de Castro, no bairro da Boa Vista, no centro da cidade.
O evento contou com a participação de urbanistas, arquitetos e sociólogos, além de admiradores de Josué de Castro. Professor, géografo, sociólogo e político, o intelectual pernambucano ganhou destaque por diagnosticar o sofrimento do povo pobre do Recife na metade do século passado. Um dos expoentes desse trabalho é a obra relançada nesta semana, originalmente publicada em 1947. "Josué de Castro faz um livro primoroso sobre a forma como o Recife nasceu e foi ocupado ao longo dos séculos”, explica o consultor de planejamento urbano Cláudio Marinho.
Retomando a obra de Josué, Marinho lembra que, na década de 1940, o Recife recebeu muitos migrantes da zona rural de Pernambuco. Mas, como a cidade já estava parcialmente ocupada, esses migrantes só encontraram lugar para se estabelecer nas zonas altas de morro ou nas áreas alagadas de manguezal. “Eles ocupam o pouco da cidade que não havia sido ocupado e isso explica muitos dos problemas urbanos que nós temos hoje, como o desmoronamento de morros com mortes e os alagamentos”, afirma o consultor.
Existentes já na época de Josué de Castro, quando o Recife tinha cerca de 50 mil habitantes, esses problemas continuam fortes na atualidade, atingindo consequentemente muito mais gente. Hoje, quase 1,6 milhão de pessoas moram na capital pernambucana. “A gente precisa repensar a cidade e Josué de Castro traz um sopro de rejuvenescimento porque traz ideias permanentes que já foram faladas 70 anos antes, mas que hoje refrescam o debate sobre o que a gente precisa na cidade”, acredita o arquiteto Francisco Cunha.
No evento, Cunha e Marinho ainda travaram um debate sobre os atuais problemas urbanísticos da capital pernambucana e as contribuições de Josué de Castro para esse cenário. “Uma preocupação que hoje está muito rara nas cidades, e no Recife em particular, é a preocupação na hora da ocupação urbana por prédios residenciais e comerciais. Nós não temos mais a preocupação, que foi tão cara a Josué, com a paisagem urbana do Recife e o planejamento da ocupação”, criticou Marinho.
A socióloga Teresa Sales, que escreveu um livro com um diálogo fictício entre Josué de Castro e de João Cabral de Melo Neto, com base na obra dos dois autores, também participou da conversa e concordou que é preciso pensar mais na ocupação da capital pernambucana. “Pensar em uma cidade que seja viável, em que nós possamos curtir e usufruir a cidade com a beleza que ela tem”, falou Sales.
Já Cunha opinou sobre a mobilidade, considerada pelo arquiteto como “a febre de um organismo doente”. “Uma mobilidade travada é sinal de que a cidade está doente. Se você pensa em uma solução, tem que abrir o caminho para outros modais, além do automóvel. Precisamos ter calçadas boas, ciclovias permanentes e faixas exclusivas para o transporte coletivo. O interessante de uma cidade é quando todos esses modais funcionam e o carro é uma opção, não a única alternativa”, argumenta.
Quem Foi Josué - Josué Apolônio de Castro mais conhecido como Josué de Castro, foi um influente médico, nutrólogo, professor, geógrafo, cientista social, político, escritor, ativista brasileiro que dedicou sua vida ao combate à fome. Destacou-se no cenário brasileiro e internacional, não só pelos seus trabalhos ecológicos sobre o problema da fome no mundo, mas também no plano político em vários organismos internacionais.
Partindo de sua experiência pessoal no Nordeste brasileiro, publicou uma extensa obra que inclui: "Geografia da Fome", "Geopolítica da Fome", "Sete Palmos de Terra e um Caixão" e "Homens e Caranguejos". Exerceu a Presidência do Conselho Executivo da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), e foi também Embaixador brasileiro junto à Organização das Nações Unidas (ONU).
Recebeu da Academia de Ciências Políticas dos Estados Unidos o Prêmio Franklin D. Roosevelt, o Conselho Mundial da Paz lhe ofereceu o Prêmio Internacional da Paz e o governo francês o condecorou como Oficial da Legião de Honra. Logo após o Golpe de Estado de 1964, teve seus direitos políticos suspensos pela ditadura militar.
No exílio, sentiu agudamente a falta do Brasil. Impedido de voltar ao país, aceitou asilar-se na cidade de Paris, onde procurou dar prosseguimento a suas atividades. Fundou e dirigiu o Centro Internacional para o Desenvolvimento, além de ter presidido a Associação Médica Internacional para o Estudo das Condições de Vida e Saúde.
Foi designado professor estrangeiro associado ao Centro Universitário Experimental de Vincennes (Universidade de Paris VIII), onde trabalhou até sua morte. Faleceu em Paris, em 24 de setembro de 1973. Seu corpo foi enterrado no cemitério São João Batista do Rio de Janeiro.
Com informações do Portal G1 e da Wikipedia