A verificação das contas do transporte público de São Paulo,
divulgada pela empresa de consultoria Ernst&Young, indica que a
prefeitura poderia reduzir em 7,4% o valor pago para as empresas e
concessionárias do sistema, se utilizar parâmetros de mercado para contabilizar
os gastos com combustível, equipamentos e mão de obra, além de garantir que
todas as viagens programadas sejam realizadas.
Outra mudança está na Taxa de Remuneração de Investimento (TIR) –
o lucro – de 18% estipulada em 2003, que embora tenha sido considerada correta,
deve ser adequada ao cenário atual, que é de aproximadamente 7,2%. O estudo foi
encomendado pela própria administração municipal para servir de base a futuros
ajustes na política de mobilidade.
O prefeito de São Paulo,
Fernando Haddad (PT - foto), considerou o resultado satisfatório e afirmou que
possibilitará maior controle e transparência aos novos contratos. “Essa será a
base para o novo edital de licitação. Os contratos têm brechas a ser
resolvidas. A partir de semana que vem vamos começar a discutir as novas
licitações”, afirmou. O relatório completo será publicado na próxima semana no Blog da Verificação da SPTrans.
A consultoria percebeu que os valores pagos para manter os ônibus
em circulação são diferentes dos verificados nas notas fiscais repassadas pelas
empresas. Do total de 7,2%, cerca de 2% correspondem a viagens não realizadas.
Segundo a Ernst&Young, uma em cada dez viagens programadas não é realizada,
o que faz com que os coletivos rodem mais cheios e o cidadão fique mais tempo
no ponto esperando.
Outros 3,5% correspondem à demando por mão de obra de motoristas e
cobradores, cujo custo é computado contando períodos de ociosidade e de hora
extra, antes mesmo de serem aferidas tais condições. Se o trabalhador cumpriu
um horário de almoço mais curto ou não realizou horas extras compatíveis com o
valor pago, a prefeitura remunera a empresa ou cooperativa da mesma forma.
Por fim a consultoria indicou que é preciso ajustar o valor pago
pelo combustível ao preço de mercado, o que representaria uma redução de 1,3%
no custo desse item. Além disso, o contrato de 2003 previa que as empresas
iriam adquirir garagens para os coletivos, consideradas um investimento. Mas
acabou-se percebendo que era mais vantajoso, financeiramente, alugar os
espaços, o que levou a um custo extra ao sistema.
Na prática o resultado da verificação das contas do sistema de
transporte é que a prefeitura pode reduzir os custos gerais do sistema na
próxima licitação, que deve ser realizada esse ano. Considerada sobre a
remuneração total do sistema paga em 2012, de aproximadamente R$ 5,6 bilhões, o
valor corresponde a cerca de R$ 392 milhões.
O montante de subsídios utilizados pela prefeitura sistema ao
longo de dez anos (2003-2013) foi de R$ 5,7 bilhões. Isso porque a tarifa
somente não é suficiente para custear o sistema. O valor equivale a 15% de
todos recursos financeiros do Sistema de Transporte Urbano por Ônibus do
Município. Porém, o valor gasto também poderia ter sido menor, se observadas as
recomendações feitas agora pela consultoria
Tantos descompassos podem ter levado a outros erros, até mesmo
dentro da São Paulo Transportes (SPTrans). Foram percebidas divergências entre
registros da Conta Sistema no Livro Razão da SPTrans e nos Relatórios
Financeiros elaborados por suas equipes técnicas. A diferença observada entre
as movimentações do Livro Razão e do Relatório Financeiro foi de
aproximadamente 9%.
Quanto ao lucro obtido pelos empresários, a consultoria considerou
que os valores da Taxa de Remuneração de Investimento em 18% estão compatíveis
com a situação do mercado na época em que os contratos foram elaborados. Na
média, o retorno em dez anos foi de 18,61%. O relatório não aponta o índice
exato de lucro, pois não foi realizada auditoria nas contas das empresas e
cooperativas. O número corresponde ao melhor cenário possível estimado pela
Ernst&Young.
A consultoria recomendou que a prefeitura insira cláusulas de
revisão desses valores ao longo do tempo de validade das concessões, para
garantir uma remuneração adequada ao mercado. Hoje, a taxa de retorno que deve
balizar os novos contratos é de 7,2%, cerca de 11% menor. O índice foi
referenciado no utilizado na concessão de pedágios da ponte Rio-Niterói, no Rio
de Janeiro.
“É claro que estamos falando do sistema de transporte da maior
cidade do país, que é um dos maiores do mundo. Não podemos comparar com um
pedágio. Vamos discutir com os empresários, com a sociedade e tentar chegar em
um valor justo”, ponderou o secretário Municipal dos Transportes, Jilmar Tatto.
Ele já adiantou que a secretaria vai realizar, pelo menos, 36 audiências
públicas a partir de janeiro de 2015, para discutir o novo modelo de contrato.
Tatto disse que o relatório “aponta para mudanças nos contratos”,
mas não quis adiantar se isso pode representar alguma alteração no valor das
tarifas. “Isso não está sendo discutido no momento”, afirmou. Sobre a taxa de
lucro, Tatto apenas garantiu que “não será de 18%”.
Para a Ernst&Yooung, alguns pontos também devem ser cuidados
para evitar que os novos contratos repitam os problemas do edital de 2003.
Entre eles, que as empresas tenham fluxo de caixa do projeto – prestação de
serviço de transporte – e não do acionista, pois ele pode ter diversas outras
atividades, o que dificulta a apuração.
Junto a isso, as empresas devem fundar Sociedades de Propósito
Específico (SPE), um modelo de organização empresarial em que se constitui uma
nova empresa com um objetivo determinado, para facilitar a gestão de contratos,
as compras de materiais e combustíveis e a captação de recursos. Isso pode
beneficiar, por exemplo, as cooperativas, que hoje não podem acessar recursos
do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Também é preciso haver mecanismos de avaliação de prestação do
serviço das empresas, com impacto positivo e negativo sobre a remuneração das
empresas. Por exemplo, controlar de forma eficiente as viagens determinadas e
as realmente realizadas com uso de GPS.
A consultoria recomendou ainda a definição de um valor máximo pago
pelo transporte de passageiros e o estabelecimento de revisões periódicas das
cláusulas contratuais de remuneração.
Rede Brasil Atual