Embora sejam usadas como uma forma alternativa de tratamento de pessoas viciadas em drogas, as comunidades terapêuticas registram graves violações de direitos humanos de dependentes químicos. A denuncia é do Conselho Federal de Psicologia (CFP), que divulgou hoje (28) o Relatório da 4ª Inspeção Nacional de Direitos Humanos.
Em setembro, membros da Comissão de Direitos Humanos do CFP visitaram 68 instituições de internação para usuários de drogas, em 24 estados e no Distrito Federal. De acordo com a conselheira do CFP e membro da comissão, Ana Luiza Castro, foram observados indícios de violações em todas as instituições visitadas, como imposição de credo, desrespeito à orientação sexual, além de casos de violência física, castigos e torturas.
O relatório aponta que em alguns locais há espaços de isolamento, ou seja, quartos fechados com cadeado, escuros e pouco arejados para os quais são levados os usuários recém-chegados ou os que têm comportamento agressivo. Em outras instituições, os internos são enterrados até o pescoço e sofrem castigos como beber água do vaso sanitário, comer refeições preparadas com alimentos estragados. O trabalho forçado, sob o nome de laborterapia, é outra característica recorrente dos tratamentos propostos.
Para Ana Luiza, os dependentes químicos não são tratados nas comunidades terapêuticas. “Eles [os usuários de drogas] estão sendo mantidos em lugares baseados na fé religiosa e no trabalho sem remuneração. A maioria [das comunidades terapêuticas] não tem psicólogos, assistentes sociais, médicos ou técnicos em enfermagem”.
Segundo a conselheira, não há dados sobre a quantidade de comunidades terapêuticas existentes no Brasil. Algumas ainda têm convênios e recebem verbas públicas. Para Ana Luiza, isso é uma falha na elaboração de políticas públicas para o setor. “A gente desconfia que tem muitas instituições funcionando à margem da lei, de qualquer regularização. A maioria desses locais é afastada. Não conseguimos localizar o site ou não tem telefone”.
O governo federal está planejando criar unidades de acolhimento para usuários de álcool e outras drogas usando como referência a experiência de comunidades terapêuticas. O objetivo é implantar tais unidades dentro do Sistema Único de Saúde (SUS).
Além de um debate amplo sobre a inclusão das comunidades terapêuticas no SUS, os membros do CFP cobram planejamento e investimentos governamentais nos serviços de saúde pública. “Não temos Caps [Centros de Atendimento Psicossocial] que funcionem 24 horas, não temos consultórios de rua, não temos vagas em hospitais gerais. A ausência dessa política traz uma fragilidade”, disse Ana Luiza.
As denúncias feitas pelo CFP foram repassadas ao ouvidor nacional de Direitos Humanos, Domingos da Silveira. “Vou encaminhar o relatório à ministra Maria do Rosário[da Secretaria de Direito Humanos] e vou estudá-lo e, é meu dever, percebendo alguma consistência nas denúncias, instaurar um procedimento coletivo de apuração”.
Para o diretor executivo da Federação Brasileira das Comunidades Terapêuticas, Maurício Landre, os conselhos regionais e federal de psicologia estão fazendo um movimento para atacar o nome das comunidade terapêuticas. “O que eles [os membros do CFP] têm observado na maioria dos casos de violação e problemas com a questão manicomial não são comunidades terapêuticas”, disse à Agência Brasil.
Segundo ele, algumas instituições se apropriam do título de comunidade terapêutica de maneira irregular, pois a comunidade terapêutica pressupõe que a pessoa queira fazer o tratamento. “Tudo que é involuntário, ou seja, o caso das internações compulsórias não é comunidade terapêutica mesmo que use esse nome. Eles resolveram colocar tudo no mesmo saco e tratar do mesmo jeito”.
Agencia Brasil